A abertura de novas unidades, como o recém-inaugurado espaço de Guarulhos, não apenas aumenta a rede de pessoas atendidas, oferecendo à população local uma ampla gama de serviços assistenciais, esportivos e culturais, como viabiliza algo infelizmente ainda escasso no país: a existência de um espaço generoso e amplo que dê abrigo à produção artística, para que ela se realize em contato direto com um público bem mais diversificado e muitas vezes distante do tradicional circuito de museus, galerias e feiras.
Basta entrar no novo prédio, que em seu primeiro fim de semana recebeu 24 mil visitantes, para perceber a importância da arte no contexto geral do projeto. Pontuam o espaço, de maneira sutil ou com um impacto indisfarçável, trabalhos realizados especialmente para o local ou selecionados a dedo na reserva técnica da instituição. Assinados por uma gama bastante variada de artistas, as obras são de autoria e gêneros diversos, compreendendo desde artesãos anônimos, como os autores dos ex-votos que compõem um painel instalado no hall de entrada, até nomes importantes da cena contemporânea. Ao todo mais de 15 autores, alguns com várias criações (como Leonilson e Sidney Amaral), assinam as obras.
Na fachada do Sesc, ainda no exterior, uma grande escultura de Sérvulo Esmeraldo recebe os visitantes. Trata-se de uma peça de grande simplicidade, que contrasta com suas dimensões colossais, com mais de dez metros de altura: dois quadrados, um branco e um azul, que se tocam parcialmente e ativam o espaço a sua volta, como desenhos que se esforçam para adquirir uma força tridimensional.
Logo na entrada, estabelecendo uma sintonia fina com a arquitetura arejada de Renato e Lilian Dal Pian, foi instalada uma monumental escultura em gesso de Carlito Carvalhosa. Com um formato semelhante ao do morro do Pão de Açúcar, no Rio, e pendurada no vazio de cabeça para baixo, com a ajuda de uma estrutura de ferro e grossos tirantes que a conectam às paredes do prédio, a peça atrai os olhares perplexos, que se perguntam sobre o caráter permanente e ao mesmo tempo instável e precário de uma montanha pesada e invertida que flutua no ar.
Mesmo sendo provavelmente a mais impactante da nova unidade, a peça de Carvalhosa, Já estava assim quando cheguei, não é a única grande obra especialmente concebida para o espaço. No mesmo hall, ocupando uma longa parede no segundo andar do prédio, está o painel criado por Adriana Varejão. Composto por sete grandes círculos com formas geométricas e orgânicas, a pintura mural se insere num projeto já desenvolvido há tempos pela artista, no qual investiga a ampla gama de cores de pele dos brasileiros, a problemática questão da autoidentificação em uma sociedade marcada por um forte, mesmo que disfarçado, racismo.
É interessante ressaltar que as escolhas de trabalhos permanentes para o novo espaço não têm a pretensão de reinventar poéticas. Pelo contrário, a proposta potencializa o alcance das obras de arte – em grande parte pelo destaque e generosidade do espaço concedidos a elas –, sem contudo sacrificar sua conexão com a poética particular de cada um dos autores. A grandiosidade e as especificidades de um centro cultural de ampla circulação não acarretam em um abandono das pesquisas dos artistas convidados. Pelo contrário, abre-lhes uma possibilidade de viabilizar algo que, na prática, é quase impossível nos nossos centros urbanos densos e fragmentados. É o caso, por exemplo, da gigantesca pintura Paisagem Desaguando, criada por Janaina Tschäpe para o ginásio e que estabelece um interessante paralelo visual com o núcleo contíguo das piscinas. Ou da obra de Eduardo Frota, composta por duas enormes peças que pertencem a sua série já conhecida dos carretéis, situada no jardim. A diferença é que neste caso optou-se pela troca dos já tradicionais perfis de madeira pelo aço, material mais resistente para uma exposição de longa duração.
É curioso notar como o artista consegue, apesar do caráter massivo do ferro, um paradoxal aspecto de leveza. Além da precisão com que é construída, com um encaixe perfeito de centenas de rodelas de aço sobrepostas, a escultura é oca em seu interior, tornando possível ver o céu através dela e dando certa transparência à brutalidade do metal.