O cantor e compositor Tim Maia, que completaria 75 anos nesta quinta-feira (28). Foto- Reprodução : Facebook
O cantor e compositor Tim Maia, que completaria 75 anos nesta quinta-feira (28). FOTO: Reprodução / Facebook

Há cerca de 10 anos, o Brasil do século 21 enfim descobriu que, em meio ao discurso monotemático de Tim Maia sobre a redenção mística por meio das crenças do Universo em Desencanto, havia pérolas musicais do soulbrother que ficaram obscurecidas por décadas. Para além da inspiração autoral que permeia as composições e arranjos de Racional nos volumes 1 e 2 (há também um terceiro registro lançado, com sobras dos dois álbuns), claro, não foram poucos os que pontuaram que Sebastião Rodrigues Maia estava ali em plena forma vocal por temporariamente ter aberto mão do que ironicamente chamava de triatlhon (o consumo simultâneo e regular de álcool, cigarro e cocaína).

Mas ao se dar conta de que Manoel Jacintho, o famigerado líder da seita Universo em Desencanto, que dizia receber mensagens de seres extraterrenos, não era mesmo o “maior homem do mundo”, como bradou o Síndico em O Grão Mestre Varonil, e sim um notório charlatão, Tim e os músicos da banda Vitória Régia, que, leais ao seu líder, também adotaram a indumentária branca e entraram em abstinência da chapação, decidiram voltar em grande forma no álbum lançado por ele em 1976.

Com a mesma riqueza musical impressa nos dois biscoitos racionais, Tim Maia fez deste seu sétimo LP, epônimo como alguns antecessores, mais um título obrigatório de sua discografia. Melhor: repetiu a dose dispensando o discurso enfadonho em torno de Manoel Jacintho e seu famigerado livro de inúmeras reimpressões oportunistas. Como sugere o título deste texto, abordaremos hoje a volta do bom e velho Tim Maia “irracional”, artista que tanto amamos, na plenitude de seus melhores predicados.

Lançado pela Polydor, com produção executiva da Seroma (gravadora de Tim, que levava as sílabas iniciais de seu nome, Sebastião Rodrigues Maia), Tim Maia(1976) reúne músicos insuspeitos: Tim (bateria, percussão, guitarra, flauta e vocais), Carlos Simões (baixo), Reginaldo Francisco (teclados e voz), Paulinho Roquete (guitarra), Paulinho Batera (percussão e bateria), José Maurício (guitarra), Antonio Pedro (baixo, percussão e voz), Paulo Ricardo Rodrigues Alves, o inseparável “Paulinho Guitarra” (guitarra solo, percussão e voz), Antônio Claudio, Luis Mendes Jr. e Gastão Lamounier (vocais). Impecáveis, os arranjos do álbum foram divididos por Tim, o maestro uruguaio Miguel Cidras e o brasileiro Arthur Verocai, que orquestrou a última canção, The Dance is Over, composta por Tim, Hyldon e o tecladista Reginaldo, também autor de Me Enganei, que abre o lado B do LP.

Capa do álbum de 1976. Foto- Divulgação : Polydor
Capa do álbum de 1976. FOTO: Divulgação / Polydor

Se o álbum é encerrado com a sentença de que a dança chegou ao fim, é justamente convocando todos a dançar, com a canção Dance Enquanto é Tempo, que Tim dá início aos quase 30 minutos de deleite musical do sucessor dos dois volumes de Racional. À mensagem hedonista de abertura, Tim sobrepõe discursos que tratam de questões diversas, como o amor expresso aos filhos em Marcio Leonardo e Telmo(canção composta em homenagem a Leo Maia, seu filho adotivo, e Carmelo Maia, seu único rebento legítimo); a nulidade que ele voltava a dar aos credos religiosos, como em Nobody Can Live Forever e Brother, Father, Sisther and Mother; e a exaltação de sua altivez negra, manifestada na poderosa Rodésia. Outro grande momento do álbum é Batata Frita, o Ladrão de Bicicletas, título que talvez faça referência a um dos clássicos do neorrealismo italiano, o filme Ladrões de Bicicletas, de Vittorio De Sica.

Em dezembro de 2009, os repórteres Marcio Gaspar e Lauro Lisboa Garcia publicaram na edição impressa de Brasileiros uma entrevista inédita com Tim Maia, resultante de um bate-papo com o músico em 1995. Leia, na íntegra

Em setembro de 2012, a repórter Natalia Chiarelli entrevistou Yale Evlev, diretor de marketing da gravadora Luaka Bop, selo criado pelo talking head David Byrne, que então havia lançado a coletânea Nobody Can Live Forever – The Existencial Soul of Tim Maia.

Apaixonado por música brasileira, Evlev enfatizou características de ineditismo na obra autoral de Tim e de um sujeito também amado por nós, que, como ele, ganhou a alcunha de Babulina, Jorge Ben Jor. Segundo Evlev, Jorge e Tim são artistas dotados de artifícios irresistíveis para o público estrangeiro.

“O soul brasileiro é soul de uma maneira tão diferente, dentro de um gênero em que isso parece ser uma impossibilidade. É justamente isso que é tão refrescante na coisa toda que eles fizeram. Tim Maia e Jorge Ben são cheios de soul, mesmo não fazendo música baseada no blues como fizeram os soulmen norte-americanos. Mas, apesar disso, o sentimento e as emoções que dão nome ao gênero, ou seja, a alma, estão amplamente representados em suas obras”, defendeu Evlev.

Boas audições e até a próxima Quintessência!

Texto Originalmente publicado no site da revista Brasileiros em 30.1.2014

Ouça o álbum, na íntegra, no Youtube

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Veja o clipe de Rodésia


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