Neste 25 de janeiro, São Paulo completa 464 anos. Habitada por mais de 12 milhões de pessoas nascidas aqui, vindas das mais diversas partes do País ou do mundo, a capital paulista jamais deixou de reiterar sua exuberância e suas controvérsias.
Acolhedora para milhões que nutrem paixão incondicional por essa espécie de “mãe geográfica”; hostil para outros milhões que vivem às margens de regiões suburbanas e periféricas, ou que aqui chegam desavisados, como nortistas, nordestinos e imigrantes, São Paulo, na juventude de seus 464 anos, segue indecifrável e plural.
Para além da vocação industrial, que a consagrou e rendeu o prepotente vulgo “Locomotiva do País”, São Paulo é também reconhecida como um epicentro de cultura efervescente nas mais diversas facetas. Não por acaso, muitos artistas egressos de outros estados do País escolheram a capital paulista como destino afetivo e espaço de amplitude de seus desejos profissionais.
A seguir, páginaB! compila depoimentos de seis artistas que longe de casa, no famigerado misto de amor e ódio, vivenciam em seu dia a dia as controvérsias humanas da maior metrópole do Brasil.
Renata Carvalho, atriz e transfeminista, Santos/SP:
A cidade de Zé Celso e do Teatro de Arena, da Roosevelt, do Satyros e Parlapatões. A cidade da Rêgo Freitas. A cidade do Transcidadania e da Casa Florescer. A cidade de Claudia Wander, Phedra de Córdoba e Thelma Lipp… Ah… Thelma Lipp e sua trágica história com o Carandiru…
A cidade que mais matou pessoas Trans no Brasil no ano passado. SP MATA TRANS. Precisamos falar sobre travestilidade e transexualidade em São Paulo. Estamos morrendo. Parabéns, São Paulo. Parabéns pra quem?
Badi Assad, cantora e violonista, São João da Boa Vista/SP:
“Tem uma forma que gosto de me definir, que é “Um pé no mato, outro no asfalto”. Digo isso por ter vindo da natureza (e adorar estar nela), mas também por gostar de sentir-me parte da metrópole. Afinal, foi na grande cidade que tive a oportunidade de entrar em contato com múltiplas culturas e seus excelentes profissionais, que me ensinaram diversidades. Em São Paulo, especialmente, sanei muito da minha sede de aprendizados, por ser uma cidade que transborda competência humana. É nela também que habitam meus mais antigos e queridos amigos. Sampa, na verdade, funciona como uma especial lâmpada mágica. Você faz o pedido e ela te devolve possibilidades concretas, num passe de sonhos.”
Milton Hatoum, escritor, natural de Manaus/AM:
Eu vim pra São Paulo na década de 70 para morar e estudar aqui. Acabei entrando na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, na Universidade de São Paulo. Foi aqui que tive uma formação mais sólida como leitor, porque eu frequentava os cursos de literatura na faculdade como ouvinte. Então, a minha guinada da arquitetura para a literatura é fruto de São Paulo. Foi uma aprendizagem. Aqui eu comecei a escrever, me dediquei à literatura. Essa cidade é parte da minha formação intelectual e sentimental. Longe de ser Cidade Linda, é das cidades brasileiras a que te oferece mais oportunidades em todos os sentidos. Aqui existem grandes patrimônios que auxiliam na cultura, o SESC de São Paulo, por exemplo, é um dos grandes dínamos da área na cidade.
Fábio Trummer, músico, natural de Olinda/PE:
“Eu costumo vivenciar os lugares onde eu estou. Eu fiz essa opção por morar em São Paulo porque eu gosto de alguns aspectos culturais e sociais da cidade. A minha obra é feita disso: das minhas observações principalmente e dos meus sentidos em relação ao meu entorno. A cidade de São Paulo tem dado à minha obra exatamente o que fui buscar enquanto pessoa, alguns outros sentidos que em Recife e Olinda eram menos presentes. É assim como vou me alimentando da música e que a música vai se alimentando de mim: é assim com a cidade. Eu me alimento da cidade e transformo isso em música. Vou vivendo o dia-a-dia assim”.
Aretha Sadick, cantora e drag queen, natural de Caxias/RJ:
“A cidade de São Paulo, nestes dois rápidos anos por aqui, me fez vivênciar duas coisas que me parecem mais importantes: COLETIVIDADE e DIREITO À CIDADE. Meu trabalho artístico reflete isso! Ser nova numa grande selva e, apesar disso, ser rapidamente abraçada pelos meus, outros meus, exercendo o direito de ocupar o espaço urbano… Acho que, por isso, hoje a música eletrônica é um dos meus campos de atuação, tanto performando, quanto cantando. Em São Paulo, encontrei novos coletivos que fortaleceram ainda mais o cunho político no meu trabalho e no meu discurso, assim como a minha Identidade de Gênero.Trabalho com imagem e, neste sentido, exploro as potencialidades e pluralidades enquanto pessoa negra na moda e no audiovisual”.
Tássia Reis, rapper, natural de Jacareí/SP:
“A primeira vez que eu visitei São Paulo pra vir numa festa de dança, eu me encantei pela atmosfera a cidade, era como se cada porta de bar, balada ou casa escondesse um universo único e totalmente diferente do outro. Aquilo me encantou… 3 anos depois vim pra cá estudar e acabei florescendo minhas composições, aquele agito e pressa das pessoas me deixava ansiosa! Logo entrei naquele fluxo de pessoas que estão apressadas e comecei a perguntar porque 24 horas não davam conta de todas as demandas. Essa cidade é muito louca, e a gente vai ficando meio loka junto! Não sei se por ter vindo de outro lugar, mas essa não-rotina é muito estimulante. Isso com certeza trouxe novas perspectivas pra minha música, escrevo muito sobre sentimentos e sensações, e vir pra cá aos 20 anos me atravessou de uma maneira muito marcante”.