Horas antes da abertura da exposição dos artistas selecionados para a Bienal de Paris de 1969, militares chegaram ao Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Era uma sexta-feira, 30 de maio. Não demoraram para fechar a mostra que incluía obras de Antônio Manuel, Humberto Espíndola, Carlos Vergara e Evandro Teixeira.
O motivo: consideraram como “provocação” selecionar para Paris o flagrante registrado por Evandro Teixeira da queda de um motociclista da Força Aérea Brasileira. “O Departamento Cultural (do Ministério de Relações Exteriores) não tomou nenhuma outra providência no sentido de explicar como ficará a questão da representação brasileira na Bienal que será aberta, em setembro, com a participação de artistas do mundo inteiro”, registrou no dia seguinte o jornal Correio da Manhã. As obras deveriam ser enviadas para a França até 1º de julho, mas isso jamais aconteceu. Afinal, estava em vigor o AI-5, que acabou com os direitos individuais e oficializou a censura prévia.
Aconteceu há 50 anos, a censura e o cerco à liberdade de expressão se estabeleceram por décadas, mas os artistas selecionados não se deixaram destruir pela mão pesada do regime. Naquele ano, no entanto, o Brasil participou da Bienal de Paris de 1969 com apenas com duas maquetes (dos arquitetos Abrão Assad, Roberto Gandolfi, Jaime Lerner, Luiz Forte Netto e José Sanchotene) e três composições musicais (de Almeida Prado,
Cardoso Lidembergue e Marlos Nobre).
Por outro lado, a X Bienal de São Paulo, também de 1969, aconteceu com convidados de última hora. Artistas de diferentes países assinaram o manifesto Non à La Biennale, que circulara na Europa e nos Estados Unidos, e desistiram de exibir suas obras no Brasil. Entre eles estava Pierre Restany, que organizaria uma sala especial sobre Arte e Tecnologia, junto com Pol Bury. Espaços vazios nos salões refletiram o impacto do movimento na mostra que acabou conhecida como a Bienal do Boicote. Tristes tempos. Ainda mais tristes no momento em que o fantasma da censura volta a pairar sobre o país.