Casado hoje com a pianista russa Ksenia Kogan Amaro e pai de 5 filhos, Marcos Amaro, filho caçula do Comandante Rolim Adolfo Amaro, fundador da TAM falecido em 2001, volta para se instalar no Brasil. Após vários anos morando fora do país, nos EUA e na Bélgica, imprime uma certa dose de oxigênio na maltratada cena cultural nacional. Ele tem o traço de empreendedor do pai. Fica claro, na forma que organiza seu trabalho e suas escolhas, que seu horizonte é amplo. É um planejador. A seguir, um pouco da sua história e projetos:
A!B: Conta um pouco sobre o seu percurso
Meu pai morreu em 2001, de um acidente de helicóptero, quando eu tinha 17 anos.
Toda a fortuna dele estava na empresa. Ele era de uma época onde o patrimônio do empresário estava todo investido na empresa. Com essa idade, fui trabalhar como trainee na TAM e cheguei a participar como membro do Conselho. Decidi sair da empresa em 2006–2007, apesar de gostar muito de aviação. Eu sou filho único do meu pai e da minha mãe. Resolvi vender minhas ações por duas razões: a primeira porque não teria possibilidade de ter o controle na empresa e também não queria depender dos meus irmãos. A segunda porque queria seguir meu próprio caminho.
Fui empreender, ser empresário. Tive as Óticas Carol, aqui no Brasil, e depois a vendi, em 2013.
Mas sempre fiz minha vida empresarial em paralelo com meu interesse na cultura e na arte.
Estudei, fiz Economia e Filosofia. A Filosofia me jogou para arte. A arte canaliza várias áreas do meu interesse. Porém, tive necessidade também de trabalhar com a matéria e foi aí que começou minha obra como artista. Recupero aviões antigos, compro peças da aeronáutica e crio esculturas. Hoje, já em um outro momento, uso concreto, maçarico, decomponho e construo.
Mas o processo todo é uma maneira de estar perto do meu pai e ao mesmo tempo conseguir criar uma linguagem minha.
A!B: O que te levou a voltar ao Brasil?
Desde 2008, comecei a colecionar e dedicar a maior parte dos meus projetos a arte.
Especificamente, meu trabalho requer muito espaço e na Bélgica não tinha. Criei a Fundação Marcos Amaro em 2012, e recentemente adquiri a marca da galeria Emmathomas, assumi dois dos artistas da galeria, Alan Fontes e a Paula Klien do Rio de Janeiro, e estou agregando um novo elenco.
Em 2017, criamos o Prêmio Marcos Amaro na sp-arte, onde damos R$ 25.000 ao artista ganhador e ainda adquirimos uma obra sua. Em 2017, o premiado foi Ivan Grilo e este ano Brígida Baltar.
A!B: É, são muitas coisas para pilotar de longe… Como nasce a Fundação e com que objetivos?
Ela nasce com alguns objetivos. O de difundir a minha obra como artista é um deles. Hoje sou seu Presidente, mas quanto mais conseguirmos profissionaliza-la menos ela vai precisar de mim. Assim, poderei me dedicar mais a minha obra como artista plástico. Ela nasce com o objetivo de investigar os caminhos da arte contemporânea, poder documentar o que se faz no Brasil e fundamentalmente promover o acervo.
Depois de 10 anos, a coleção tem mais de 1000 obras que vão do barroco ao contemporâneo. Será predominantemente brasileira, composta de esculturas, uma coleção importante de fotografias e pinturas – gravuras e desenhos – e com artistas latinoamericanos. Nesse sentido comecei a me desfazer de peças europeias e estadounidense que deixaram de estar no foco da coleção.
[No fechamento desta edição, soubemos que Marcos Amaro tinha doado um Andy Warhol à coleção do MASP].
A coleção de esculturas não é aleatória, especificamente ela dialoga com o meu trabalho. Alguns dos artistas que já fazem parte são Cildo Meireles, Nuno Ramos, Tunga, León Ferrari e Henrique Oliveira.
A Fundação Marcos Amaro juridicamente é uma associação, uma Oscip. Justamente neste momento estou separando aquilo que é da coleção particular e o que será do acervo da Fundação. Para isso, estou fazendo acordos de comodato. Acho necessário criar essa profissionalização. Quero separar claramente, dar densidade ao projeto.
A!B: Como você pretende mostrar a coleção?
Raquel Fayad é diretora da Fundação e convidei o curador Ricardo Resende como curador responsável de ir mostrando a coleção como um todo, criando exposições com diferentes poéticas. O que mostrar, o que escolher, porque em cada mostra. Sempre fiquei muito focado em desenvolver meu trabalho, e como não estudei arte formalmente, por exemplo, não sabia que existia um escultor americano que trabalhava com sucata e numa linha muito parecida a que eu segui, o John Chamberlaine.
Isso soube num dos nossos encontros. Hoje consigo perceber muitas coisas interessantes no meu diálogo com Ricardo. Para mim isto é muito importante.
A!B: e como a Fundação vai funcionar?
A Fundação hoje possui dois espaços. A Fabrica de Arte Marcos Amaro (FAMA) em Itú, onde originariamente funciona meu ateliê. Uma antiga fábrica de tecidos, a fábrica São Pedro, a segunda mais importante do estado de São Paulo. E aí vamos desenvolver varias atividades. Criamos um Programa anual, um edital, que seleciona 4 artistas para intervir no espaço. Neste primeiro foram escolhidos, a partir de um júri presidido pelo Curador da Fundação Marcos Amaro, Ricardo Resende e composto pelos curadores convidados Bitu Cassundé, Fortaleza, Douglas de Freitas de São Paulo e Marcus Lontra do Rio de Janeiro, os artistas Edith Derdyk de São Paulo, com o projeto Arranque, Eduardo Frota, A Queda do Céu, de Fortaleza; o Coletivo Grupo EmpreZa com a Fábrica Grupo EmpreZa, de Goiânia; Pola Fernandez, Hipóstasis, de Itu; Regina Parra , Coreografia da Sobrevivência, de São Paulo; e o Rodrigo Sassi, Tríptico, de São Paulo.
Fazemos também, parcerias de residência com a UNESP, com os professores e artistas, José Spaniol e Sergio Romagnolo, onde organizamos a vinda à FAMA, de até 50 alunos que ficam numa espécie de residência, durante uma semana, produzindo e pesquisando esculturas efêmeras.
O outro espaço, que devemos inaugurar no segundo semestre deste ano, é uma propriedade de 100 mil metros quadrados, em Mairinque, perto do Itu, onde estamos criando o MESCLA, Museu de Escultura Contemporânea Latinoamericana, cujo foco será o land-art, esculturas na paisagem, exposições de esculturas efêmeras. A primeira artista a instalar um projeto lá é a Marcia Pastore, que acabou de expor no MuBE de São Paulo.
A!B: Que tipo de autonomia você pretende criar para esse funcionamento?
Pretendo que o projeto se viabilize de diferentes formas, caso eu venha a adquirir o espaço por exemplo, pode ser uma fonte de renda para o próprio projeto. Estou tentando que este projeto se viabilize no tempo. A Fundação já existe como Fundação no meu testamento. A pesar de eu ser muito jovem tenho um testamento onde ela é tratada como mais um filho. Todos os trabalhos de arte não fazem parte do espolio, pertencem a fundação. Existe um Fundo e, sua administração financeira prove os recursos necessários para o funcionamento da fundação. Porém, os recursos vem do ganho financeiro de capital que o Fundo vai dar e não do capital principal. Essa é uma forma de garantir que, algo que estou construindo, se perpetue.
A!B: Quando abre oficialmente a primeira exibição?
Dia 23 de Junho, com a mostra O tridimensional na coleção Marcos Amaro: frente, fundo, em cima, embaixo, lados, volume, forma e cor, em sua sede, na Fábrica de Arte Marcos Amaro (FAMA), em Itu.
Nesse dia, também inauguraremos a Sala Almeida Junior, onde mostraremos uma obra que adquirimos do pintor José Ferraz de Almeida Júnior, artista plástico brasileiro, nascido em Itu. A pintura O Descanso da Modelo (ou “do modelo”) é uma obra realista, produzida em Paris em 1822, ainda quando o pintor estudava na cidade, enviado por Dom Pedro II. [O quadro possui quatro versões, três das quais transitam por coleções privadas. Uma delas, a maior, está exposta na galeria de arte brasileira do século XIX do MNBA, o Museu Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro, e foi adquirida pela Academia Imperial de Belas Artes em 1882].
Almeida Jr. foi reconhecido na sua volta para o Brasil como um retratista da figura do homem comum, do caipira.
A mostra se expande para além dos limites deste espaço. Os jardins da fábrica serão tomados por grandes esculturas dos artistas Caciporé Torres, Emanoel Araújo, Gilberto Salvador, José Resende, José Spaniol, Marcos Amaro, Mario Cravo, Mestre Didi, Sergio Romagnolo, León Ferrari, Nuno Ramos, Nelson Leirner.
A!B: Por que decidir também ter uma galeria?
A diretora da galeria é Marlize Corsato, com longa experiência no mercado e Ricardo Resende é também seu Diretor artístico.
Uma galeria me ajuda como colecionador a acompanhar o mercado, compreender os parceiros. Primeiro, ela é um investimento. Ainda mais num momento como este, cheio de incertezas. Mas, até por isso, é uma forma de fomentar o mercado, criar novos colecionadores, e também inserir ou reinserir no mercado alguns artistas que são fundamentais na história da arte do nosso pais e não adquiriram o espaço necessário.
Por exemplo, Aguilar, quem pretendo convidar para uma exposição na galeria depois de ter visto seus últimos trabalhos e que me pareceram incríveis. Usando uma palavra um tanto forte, artistas que foram de alguma forma marginalizados. E também provocar novas oportunidades.
A ideia é promover contrastes, com artistas como Gilberto Salvador que tem uma obra hoje até mais contundente da que fazia nos anos 60, na época da ditadura, e artistas mais jovens como Mundano, que é originalmente um artista de rua, com uma obra política. O trabalho dele com os catadores de sucata é excelente. Acho importante criar uma permanente experimentação. Um laboratório.
[Marcos Amaro é muito jovem, tem apenas 33 anos e já demostrou ao que veio. Como ele mesmo diz, “Sou poeta mas não rasgo dinheiro”].