Paulo Tavares – Memória da Terra


No seminário “Arte Além da Arte” (6 de setembro de 2018), Paulo Tavares, co-curador da Bienal de Arquitetura de Chicago de 2019 e professor da Universidade de Brasília, iniciou sua fala propondo uma pergunta: “Se a cidade e o território são direitos, pode ser a arquitetura concebida como uma forma de advocacia deste direito? E o que isso significa?”.

O arquiteto e curador apresentou o projeto Memória da Terra, relacionado ao processo de deslocamento forçado dos índios Xavante do Mato Grosso, no qual, justamente, a arquitetura – “o desenho, a modelagem, o mapeamento” – são utilizados como instrumento de advocacia de direitos.

“É preciso dizer que o processo de modernização do território brasileiro tem uma fundação intrinsicamente colonial”, disse ele. Tavares afirmou que o projeto de destruição ambiental vivido pelo Brasil no século 20, especialmente no período da ditadura militar, foi também um projeto arquitetônico de território. Ele discorreu sobre o que foi chamado de “processo de pacificação”, ou seja, a criação de postos indígenas que concentraram as populações ameríndias e, retirando-as de seus territórios originais, liberaram as terras para exploração.

Dada a dificuldade de mapear fisicamente o desaparecimento de populações indígenas, justamente pela falta de registros governamentais, o projeto Memória da Terra passou a investigar a remoção forçada dos povos Xavante de seus territórios a partir das imagens existentes. Com fotos feitas por jornalistas da época sobre a “conquista” das terras indígenas, Tavares e os outros integrantes do projeto passaram a fazer uma espécie de “arqueologia da imagem”, utilizando estratégias da arquitetura para reconstituir o mapa dessas aldeias desaparecidas.

Assim, relacionando o desenho das aldeias – sempre uma espécie de estrutura em arco – vistos nas fotos com imagens de satélites antigas recentemente tornadas públicas pelos EUA, os pesquisadores do projeto conseguiram mapear as aldeias. Também se utilizaram das marcas que se podem ver nos territórios, como assinaturas no chão, definidas pelo padrão botânico. “As árvores cresceram na mesma estrutura em arco em que eram desenhadas as aldeias. Assim, a história desse povo continua registrada na própria composição botânica da floresta.”

Esse desenho botânico, portanto, é fruto direto da arquitetura dessas aldeias, explicou Tavares. “São produtos das ruínas, mas são ruínas vivas. Podemos então entender árvores e plantas como monumentos históricos? Pode ser a floresta considerada um patrimônio urbano, arquitetônico? Pode ela ser vista como cultura, não natureza?”

Considerando a resposta positiva para estas questões, o projeto se desdobrou em um relatório que, junto com as outras provas colhidas pelo Ministério Público, servem como “material evidenciário” para uma petição que foi feita ao Iphan e a Unesco para que este solo seja considerado um patrimônio arquitetônico. O trabalho tem sido feito também em parceria com as populações indígenas da região, como mostrou Tavares ao longo de sua exposição.

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