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A exposição de Tony Camargo no Museu Oscar Niemeyer (MON) de Curitiba é uma espécie de cartografia das rotas que sua pintura trilhou em duas décadas, em que a cor se impõe na temporalidade de sua obra. O tempo é o desafio do artista curitibano, cujo trabalho transcende o simples estágio da pintura que já percorreu caminhos variados tangenciando a estética da publicidade.

Uma das tentativas do artista é integrar a pintura a um universo em que a multidisciplinaridade de recursos técnicos possa colocar ao seu alcance todos os meios e efeitos que consiga captar. Desde seu início na pintura, Tony Camargo já explorava as possibilidades combinatórias de cores em obras construtivas e cromáticas, no humor popular, sem intenção de chegar ao comics, mas centrado na preocupação espacial e na linguagem.

A realidade como jogo de armar e a irrupção de linguagens nas dobras do cotidiano são parte da ficção inventada por ele. Pinturas, desenhos, fotografias, vídeos e objetos formam uma antologia, combustível que move Seleta Crômica e Objetos, exposição ampla que abarca 20 anos de arte. “As frentes de operação de Tony Camargo sempre surpreenderam pelo inesperado de suas estratégias de revigoramento da percepção visual num mundo saturado de imagens fotográficas, televisivas e digitais de toda espécie”, escreve Paulo Herkenhoff em um texto para o catálogo da mostra que ainda inclui autores como Arthur do Carmo e Artur Freitas”.   O alcance desse laço, entre o artista e as linguagens que o habilitam, é evidente por toda a mostra. Em sua trajetória, a cor abre veios precisos no rio caudaloso que se alinha e se distancia de uma produção, que ora se mistura à lógica da publicidade com o uso de cores e signos sem restrições, ora mergulha no suburbano. Os vídeos, discursos complementares nessa busca de linguagens reveladoras se aproximam do caos urbano, mexem e remexem o excedente da sociedade e trabalham com os resíduos em performances intermitentes que nascem, em sua maioria, em espaços públicos.

A exposição não compartimenta nenhuma de suas fases, ao contrário, faz com que tudo se conecte, numa analogia de linguagem, com diálogo permanente. Tony Camargo começou na arte com o interesse na transposição de objetos de um lugar para o outro, influenciado por artistas como Duchamp, Cildo Meireles, Waltércio Caldas e fortemente comprometido com o espírito da pintura. “Quando buscamos problemas internos pictóricos, de alguma coisa já elaborada, chegamos a algo novo e é isso o que mais me interessa”.

Tony-Camargo, Baralhos, 2002, dimensões variáveis.
Tony Camargo, 2016_Laca, nitrocelulose, pasta e-tinta acrilica sobre MDF.

As pinturas de Tony Camargo são de superfície limpa, densas na leitura de composições e seus vídeos/performances se aproximam do mundano. De alguma forma seus trabalhos têm ingredientes políticos o que para ele é um valor intrínseco na obra de arte. “ A forma como vejo o mundo, como trabalho os objetos, como me relaciono com o cotidiano. A publicidade também é uma ferramenta política e eu faço uso dela”.

Tony Camargo, 2010 impressão inkjet sobre tela aplicada em poliestireno

Muito de seu trabalho tem a ver com a admiração confessa pela obra de Philip Guston, expressionista abstrato norte-americano que dizia: “a pintura é impura, e é o ajustamento de `impurezas´ que força a continuidade da pintura”. Apesar de, em alguns momentos, seus desenhos tangenciarem o quadrinho, ele nega essa influência. “Também não vi muitos grafites, só muitas pinturas”. Seus vídeos trazem uma forte carga performática e é com ela que cria objetos. Na grande sala do MON os vídeos, com transbordamentos de imagens, se mimetizam em pinturas e os sons dos diversos monitores se misturam com as tintas das pinturas. Os “ruídos” estão todos identificados e a ideia é fazer uma pintura que se junte a eles, embora cada peça tenha a sua autonomia. As imagens estão ligadas ao real, assim como todos os objetos do mundo, embora haja uma relação entre eles. Tony Camargo “performa” em terrenos baldios cheios de entulhos e esses resíduos tornam-se sua matéria prima.

A expografia de Seleta Crômica e Objetos não separa os vídeos das pinturas, trabalha com a complementaridade. A exposição que abarca duas décadas também mostra algo novo para o artista. “Agora, diante de tantas obras e com possibilidade de um distanciamento crítico, me coloco como espectador. A exposição faz relações que eu não via em separado, mostra novas coisas, novas possibilidades”. Quando um artista está no processo de produção ele não se dá tempo para refletir a obra. “Em uma galeria, trabalhamos em um campo mais restrito, é mais difícil de se ter uma visão mais global da produção, diferente de um espaço de museu. Em ambientes amplos, acabo atuando também como curador, escolhendo obras para colocá-las onde e como quero”. Alguns trabalhos foram reeditados para essa mostra. “Há peças com acabamento industrial que, ao longo dos anos, sofreram avarias ao serem transportadas de um local a outro”.

A extensa exposição contempla jogos de luminosidade, planos colorísticos e obras de intensa experimentação. “Há séries que estão representadas por nove obras, mas no total elas chegam a somar 70 trabalhos”. O artista está ligado ao discurso social e confessa que esse momento político de censura sobre a produção artística naturalmente afeta seu trabalho. As manchas, o lixo, o caótico, como estridências sociais estão presentes em várias obras sobre as quais ele tenta uma ordenação do que está fora do controle.

 

Serviço

“Seleta Crômica e Objetos”, de Tony Camargo

Até 1° de julho de 2018 – Sala 2

Dias e horários especiais

Toda quarta gratuita com programação especial: 10h às 18h

Primeira quinta do mês: horário estendido até 20h, gratuito após as 18h.

 

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