Destaque na premiação, que acontecerá na próxima segunda-feira (26), em São Paulo, Eduardo Saron será recebido pelo Secretario de Cultura, José Luiz Penna, como Destaque Cultural do Ano e pela sua contribuição e incentivo a difusão de cultura no estado, ele receberá prêmio de R$100 mil.
Mestre em Administração e pós-graduado em Turismo Cultural, o homenageado soma experiência em Gestão Cultural. Prova disso é sua presença nos conselhos do MASP, SP Companhia de Dança e do Conselho Nacional de Políticas Culturais do Ministério da Cultura.
Em entrevista ao PáginaB!, o secretário de Cultura do estado, José Luiz Penna, afirmou ter recebido com felicidade a notícia da homenagem a Saron como Destaque Cultural. “Foi unânime a escolha dele pelo conselho do Prêmio. O conjunto de obra dele é imbatível, realmente dignificante e justo o reconhecimento da instituição [Itaú Cultural] e dele próprio”, disse.
Ao PáginaB!, Saron falou sobre a gestão cultural brasileira. Para ele, a alta rotatividade de ministros no MinC, Ministério da Cultura, é um problema considerável. “Em 32 anos, já passaram pela pasta 20 ministros, uma média de 1,6 por ano. Lembrando que, neste período, a pasta chegou a ser extinta no governo Collor e, mais recentemente, no início do governo Temer”, explicou. “Isso dificulta muito a criação de uma política cultural pública, com ações efetivas e pensamento estratégico”.
Para o diretor do Itaú Cultural, o investimento na pasta deveria ser prioridade, e o sucesso de politicas publicas culturais poderiam levar à redução de investimento de recursos em Segurança Publica e Saúde a médio prazo.
Atualmente, a Secretaria de Cultura recebe 0,27% do orçamento estadual, “isso representa cerca de R$500 milhões. Precisamos de pelo menos o dobro disso”, apontou José Luiz Penna, secretario da pasta. Questionado sobre as expectativas com as eleições para governo estadual, Penna disse apenas que espera que “o crescimento da Secretaria correspondente a expectativa da sociedade sobre a cultura sensibilize os homens públicos”.
Em 2017, Eduardo Saron completou 15 anos à frente do Itaú Cultural. Em entrevista ao portal, ele falou sobre o que, em sua avaliação funcionou ou não nas gestões do MinC e de outras instituições:
O Ministério da Cultura tem uma alta rotatividade de ministros, qual o impacto disso na criação e salvaguarda de políticas culturais?
A rotatividade no Ministério da Cultura é, de fato alta, o que não é positivo. Nos seus 32 anos de existência, passaram por lá 20 ministros, uma média de 1,6 por ano. Lembrando que, neste período, a pasta chegou a ser extinta no governo Collor e, mais recentemente, no início do governo Temer. Os dois ministros mais longevos foram o Francisco Weffort, que ficou 8 anos, durante o governo FHC, e o Gilberto Gil, que ficou 6 anos, durante o governo Lula. Isso dificulta muito a criação de uma política cultural pública, com ações efetivas e pensamento estratégico.
Qual, na sua avaliação, seria um primeiro passo para alinhar as ideias e a realidade na construção de políticas culturais solidas que sofram menos com essa rotatividade?
Ao contrário do que é recorrente no país, a cultura deveria ser encarada como uma prioridade nas políticas públicas. Na medida em que ela assume um papel de centralidade, a médio e longo prazo, precisaremos de menos recursos para a segurança pública e de menos recursos até para a saúde.
Qual o papel do Itaú Cultural na mediação entre cultura e o acesso da população a ela?
O Itaú Cultural surgiu dois anos depois do MinC sendo, muito provavelmente, uma das primeiras instituições privadas brasileiras a serem criadas com um objetivo concreto e uma agenda voltada para a valorização da cultura. Em um primeiro passo, trabalhamos firmemente pela democratização da cultura, procurando garantir o acesso por todas as populações de todos esses brasis que compõem o país. Agora, o passo é garantir a manutenção da democratização na cultura brasileira e iniciar uma construção de valores de uma democracia Cultural, em que sujeitos, indivíduos assumem o protagonismo nas políticas culturais junto com as instituições e poder público. Acredito que caminharemos muito neste sentido.
Que nomes ou instituições, hoje, trazem bons projetos culturais para o Brasil, na sua avaliação?
Não citaria apenas uma. Há quase dois anos um conjunto de mais de 150 instituições de todo o país nos unimos e formamos o Fórum Brasileiro Pelos Direitos Culturais. Este coletivo foi fundamental no retorno do MinC, na batalha pelas reformulações da Lei Rouanet e tem brigado pelos recursos que o poder público deveria e deve dedicar à cultura. Acredito muito na relevância e no trabalho de todas as instituições, coletivos e pequenos produtores que formam o Fórum.
E quem deixa a desejar e por quê?
Deixam a desejar as instituições que se agarram no que chamo de CEP – Catraca, Espetacularização e Ponte. Para algumas instituições, o importante é o número de pessoas que passam pelas suas catracas, elevando, assim, a distorção sobre o que é realmente a democratização do acesso e a constituição dos direitos culturais. Claro, que ter público é fundamental, mas não deve ser a única métrica para tudo. É preciso formar o público, oferecer formação cultural.
A espetacularização tem a ver com o boom das commodities reduzindo a cultura meramente a projetos de marketing que aposta em alocar recursos mais nos fogos e artifícios, do que no fazer artístico ou na ação cultural. Não estou falando contra o business e a indústria do entretenimento, nem ignorando a importância de alavancagem reputacional das marcas pela cultura, pois também são importantes para a indústria cultural e para as boas relações. Meu ponto se estende à artificialização dos projetos em nome da venda e do natural desespero, colocando em segundo plano o artista.
Por fim, o “p” de ponte e de prédio. As commodities geraram superávits fiscais sobre bolhas e o gestor público transferiu um cacoete dos governantes para o mundo cultural. O mais importante era construir pontes, ao invés de cuidar do saneamento básico ou de outras ações mais estruturantes, porém com pouco impacto midiático. E aí o Brasil se deparou com um número importante de novos prédios culturais, esquecendo, muitas vezes, dos já existentes ou mesmo da sustentabilidade desses novos. Infelizmente, o boom das commodities passou e a orientação do CEP se deparou com a realidade do mundo digital e da criatividade, na qual as commodities são sarcasticamente antagônicas. Portanto, a catraca, a partir da espetacularização e dos prédios, não resistiu.
Casos como o do MAM e do Queermuseum representam um risco para as liberdades de expressão e manifestação de outros museus e artistas ou deveriam ser pensados como casos isolados e específicos?
Qualquer reação extrema, de censura e impedimento à liberdade de expressão representam sérios riscos. A meu ver, a origem destas crises com as quais nos deparamos no ano passado é o comportamento gerado pelos algoritmos das redes sociais, que colocam em contato apenas aqueles que se afinam entre si. Os museus têm de dialogar com isso e usar acontecimentos como estes como aprendizado. “A classe artística tem de liderar esse debate na sociedade, tem o desafio de encontrar o ponto de equilíbrio entre a liberdade de expressão e a defesa da criança e do adolescente. A partir destes acontecimentos, começamos a trabalhar para conhecer o Estatuto do Menor, criar um manual para fazer a autoclassificação das exposições e poder informar corretamente o público sobre o conteúdo das mostras que vai ver.