Uma corrente naval envolve as árvores e, puxada por dois tratores, derruba tudo que encontra pelo caminho. Essa é mais uma das cenas de desmatamento comuns ao Brasil em derrubadas legais e ilegais. O “correntão de desmatamento”, como ficou popularmente conhecido, é base para o projeto da nova obra temporária do Jardim de Esculturas do Museu de Arte Moderna de São Paulo: Cobra grande, de Frederico Filippi.
Quem visita o Parque do Ibirapuera, vê em frente ao MAM uma corrente em tamanho real, com cerca de 40 metros de extensão, rodeando as árvores. Porém, ao se aproximar nota que o instrumento de destruição, neste caso, é feito de argila, areia e palha. “Tinha essa ideia de colocar em oposição também a forma simbólica da corrente, que é um material super agressivo, ferro fundido, algo que é representativo do universo industrial. Quando você olha, nota o elo sendo feito de terra”.
A obra da sequência a uma pesquisa de Filippi sobre a América do Sul e o desmatamento. “Comecei a pesquisar a história da invasão e da invenção dessa ideia de ‘América’, quais imagens surgiam desse atrito entre os que chegaram e os que já estavam lá, que tipo de tipo de movimentos peristálticos é esse de ‘digestão’ do mundo, que vai reduzindo um outro mundo e que quem está dentro dessa zona de atrito?”
Essa ideia de digestão dá nome à obra. Cobra grande retoma a figura comum a diversas cosmogonias, como criadora de mundos. “O formato que a corrente adquire conforme ela vai andando pelo mapa é um formato esguio. Ela serpenteia também. Então, o que ficava muito na minha cabeça? Essa imagem é uma espécie de de uma segunda cobra, uma outra cobra em diálogo com a entidade. Ela não deixa de ser também uma cobra grande, porque tem também essa escatologia dentro dela, é o fim daquele mundo, naquele lugar”, explica o artista. Assim, busca explicitar essa reflexão sobre a fronteira entre a floresta e a indústria: “Esse atrito entre duas entidades, cada uma representando um lado da fronteira.”
Por sua composição, a obra assume um caráter efêmero. Com as chuvas e interpéries climáticas, o trabalho irá se desfazer e será absorvido pelo solo do jardim.
A arte!brasileiros acompanhou a montagem da obra e conversou com o artista. Confira: