Até o dia 17 de agosto, filmes, encontros e debates – organizados pelo Sesc São Paulo junto do Instituto Italiano di Cultura – homenageiam Pier Paolo Pasolini, emblemático cineasta italiano cujos 100 anos teriam sido completos em 2022. Ao todo, 19 filmes serão projetados no CineSesc, em cópias restauradas em 2k e 4K e uma sessão especial em 35mm. Um ciclo de palestras on-line com a presença de professores e críticos será realizado pelo Centro de Pesquisa e Formação do Sesc. Além disso, duas aulas magnas sobre Pasolini com pesquisadores italianos serão disponibilizadas on-line. No dia 17 de agosto, cinco títulos dirigidos por Pasolini serão disponibilizados gratuitamente na plataforma Sesc Digital, onde ficam disponíveis por 30 dias ou até esgotarem os limites de visualização.
Para Michele Gialdroni, diretor do Istituto Italiano di Cultura de São Paulo, o centenário de Pasolini é uma oportunidade de homenagear a vida e obra de um autor inevitável. “Todos têm seu Pasolini, o apocalíptico e o elegíaco, o violento e o delicado, o comunista e o católico, o tradicionalista e o moderníssimo, o clássico e o vanguardista, o intelectual sofisticado e o frequentador das ruas de subúrbio, o filólogo e o cineasta, o poeta e o colunista. Eu também tenho meu próprio Pasolini”, declara.
Nascido em 5 de março de 1922, em Bolonha, no norte da Itália, Pier Paolo Pasolini era gay, católico e comunista. Formou-se em Estudos Literários pela Universidade de Bolonha, publicou livros de poesia, contos e romances. Foi poeta, editor, ensaísta, roteirista, jornalista e crítico cultural. Tornou-se cineasta em torno dos seus quarenta anos, ganhando assim projeção internacional e uma obra atacada por todos os lados. Inevitável nela era a crítica à sociedade do consumo e à burguesia.
Entre os destaques da programação (clique aqui para acessá-la por completo), o público que estiver em São Paulo poderá assistir ao primeiro longa-metragem do diretor, Accattone – Desajuste Social (1961); Mamma Roma (1962) – sobre uma prostituta de meia-idade que sonha em mudar de classe social para poder voltar a viver com seu filho adolescente, Ettore; O Evangelho Segundo São Mateus (1964) – prêmio do juri no Festival de Veneza; à trilogia da vida, realizada pouco antes de sua morte precoce, em 1975, e formada pelos filmes Decameron (1971), Contos de Canterbury (1972) e As Mil e uma Noites (1974); e à sua última produção Salò, ou os 120 Dias de Sodoma (1975), adaptação da obra do Marquês de Sade, onde o cineasta apresenta sua visão sobre o poder, a sexualidade, o conformismo e a juventude italiana dos anos 1970.
Ciclo de Palestras
A fim de dar conta da extensa obra e pensamento de Pier Paolo Pasolini, um ciclo de quatro palestras apresenta diferentes aspectos e interpretações sobre seu trabalho. As palestras acontecem online, sempre das 15h às 17h, em youtube.com/cpfsesc.
O cinema moderno de Pasolini
08/08, das 15h às 17h
Uma abordagem sobre a concepção de Pasolini do cinema moderno como um “cinema de poesia”; uma formulação que supõe que este cinema, ao expressar a visão de mundo de seu autor, imprime, ao mesmo tempo, toda ênfase à “função poética da linguagem”. Ou seja, aquela construção formal que faz a obra de arte chamar a atenção sobre si mesma, ao contrário do cinema clássico que procura fazer com que a tela se torne uma janela transparente para o mundo. Colocada esta premissa, o objetivo é apresentar uma reflexão sobre a sua noção mais original: a de “subjetiva indireta livre” formulada a partir de uma reflexão que parte do chamado “estilo indireto livre”, conceito usado pela teoria do romance para qualificar um procedimento do narrador em sua expressão do ponto de vista de uma determinada personagem. Com Ismail Xavier, pesquisador, crítico e professor de cinema. Professor associado da Universidade de São Paulo, publicou diversos livros e artigos que são referência na área de cinema no Brasil e internacionalmente.
A lama de outras era: anacronismo como resistência no cinema de Pasolini
09/08, das 15h às 17h
Frequentemente evocado como grande polemista, Pasolini assumiu artística e biograficamente o combate contra uma forma pervasiva de fascismo que ganhava escala na sociedade italiana dos anos 1960 e 1970: a onipresença do consumo. Assim, ele engendra um universo poético que manifesta uma tomada de posição política: figurativizações de formas ancestrais e periféricas da vida social representam uma via de resistência contra a homogeneização das diferenças culturais. A estética apocalíptica do cineasta instaura assim a dinâmica do anacronismo: no interior da própria lógica industrial burguesa, emergem as temporalidades e mentalidades disruptivas de um mundo arcaico que não se deixa reduzir à assimilação mercadológica. Com Mariana Duccini, doutora em Ciências da Comunicação pela ECA/USP. É coorganizadora dos livros “Gêneros cinematográficos e audiovisuais: perspectivas contemporâneas” (volume 2 e volume 3, prelo).
A influência de Pasolini na vida cultural brasileira
15/08, das 15h às 17h
Pier Paolo Pasolini, poeta, romancista, cineasta, crítico, semiólogo, intelectual de intervenção, faria 100 anos em 2022. O fio condutor da aula é resumido nas palavras de Roberto Esposito: “o pensamento de Pasolini prospera nas zonas mais densas da matéria social: a política, a história e a vida”. Tanto os poemas e narrativas, os filmes como seu ensaísmo crítico serão vistos num constante movimento de experimentação que aterrizam, em ondas, na vida cultural brasileira desde o Cinema Novo, nos anos 60, até as mais recentes traduções como as dos poemas de “As Cinzas de Gramsci” e do ensaísmo de urgência do livro Escritos corsários (Editora 34, 2020). Com Maria Betânia Amoroso, professora colaboradora no Departamento de Teoria Literária da Unicamp, Livre Docente na área de Literatura Comparada. Entre os autores estudados, é central o conjunto da produção de Pier Paolo Pasolini.
A semiologia da realidade de Pasolini
16/08, das 15h às 17h
A palestra parte de um exercício especulativo: que leitura faria Pasolini da realidade atual, veria ele aí a emergência de um terceiro tipo de fascismo? Enquanto realizava filmes herméticos que causavam escândalo e eram alvo da censura e da homofobia, o cineasta formulava uma teoria da vida a partir de seu estudo da linguagem do cinema. Assim como a montagem organiza e dá sentido ao filme, Pasolini atribuiu à morte o poder de organizar o sentido da existência. A partir desse insight, ele passa a ler a realidade como um discurso vivo, atribuindo ao consumo uma revolução antropológica, capaz de produzir a mutação de um povo inteiro. Tal modalidade de fascismo, chamado de consumismo, era ainda mais insidioso do que o fascismo histórico. Com Luiz Nazário, professor titular de Cinema da Escola de Belas Artes da UFMG, doutor em História pela USP. Escritor e ensaísta, publicou, entre outros, os livros “Todos os corpos de Pasolini” (2007) e “O cinema errante” (2013).