Page 26 - ARTE!Brasileiros #38
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PATRIMÔNIO INTERVENÇÃO






             MONUMENTO SEM DIÁLOGO





             INTERVENÇÕES COM TINTA NO MONUMENTO ÀS BANDEIRAS, DE BRECHERET, CRIA CONFLITO
             ENTRE GRUPOS QUE DEFENDEM A PRESERVAÇÃO DA OBRA E AQUELES QUE ENXERGAM NELA
             UMA FORMA DE APOLOGIA AOS HOMENS QUE EXTERMINARAM ÍNDIOS DURANTE A COLONIZAÇÃO


             POR MARIANA TESSITORE


             DURANTE A CAMPANHA ELEITORAL pela prefeitura      215, que propunha retirar do Executivo a autonomia da
             de São Paulo, o então candidato João Doria (PSDB) fez   demarcação de terras, transferindo-a para o Congresso
             um vídeo em frente ao Monumento às Bandeiras. Ele   Nacional. O ato também levou os manifestantes a pintar,
             condenava a “depredação” da obra que, na noite do dia   também de vermelho, o Monumento às Bandeiras, tal
             29 de setembro, fora pintada de vermelho por um casal,   qual na ação do ano passado.
             conforme registrado por câmeras de segurança da pre-  “A história de São Paulo tem os bandeirantes como
             feitura. Na mesma noite, a escultura do Borba Gato, outro   heróis, mas para nós eles representam o contrário,
             bandeirante, também apareceu tingida, da mesma cor.  tendo perseguido e matado os nossos antepassados. É
             Em janeiro, Doria tomou posse como prefeito de São   uma herança terrível, que continua até hoje na bancada
             Paulo, iniciando uma ação polêmica de limpeza de muros,   ruralista dentro do Congresso. Com a nossa intervenção,
             apagando grafites e pichações. Mas sobrou, do episódio   queríamos chamar a atenção para essa continuidade”,
             protagonizado pelo Monumento às Bandeiras, cartão-  afirma Tupã.
             -postal da cidade, outro debate, para além da questão   Neste ano, outro grupo realizou uma ação em frente ao
             que dividiu defensores do grafite e das ações encampa -  monumento. Convidado pela Secretaria de Cultura de
             das pelo poder público. A pichação da obra de Brecheret  São Paulo, o coletivo SP Safari promoveu um encontro
             carregava em si uma segunda manifestação política,   para refletir sobre a história da cidade, a partir da obra
             ainda mais específica, uma vez que a obra de Victor   de Brecheret. Um dos idealizadores da ação, o professor
             Brecheret faz homenagem aos pioneiros da colonização.   da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP Renato
             Idealizada na década de 1920, a escultura foi inaugurada   Cymbalista, comenta a complexidade do assunto.
             mais de 30 anos depois, em 1953, nas comemorações do  “Na conversa, nós abordamos as diversas leituras possí -
             quarto centenário da cidade. O monumento é composto   veis a respeito da obra. Falamos sobre a trajetória do Bre
                                                                                                             -
             por 240 blocos de granito, cada um pesando 50 tonela -  cheret, a história do monumento, que foi interrompido
             das. Trata-se de uma representação dos bandeirantes,   durante o Estado Novo e inaugurado apenas em 1953,
             personagens controversos da história paulista, ora   a figura dos bandeirantes e os protestos indígenas.” O
             associados ao progresso da nação, ora ao extermínio   urbanista defende que é preciso discutir o significado
             dos grupos indígenas.                             do monumento com a sociedade: “Ele foi feito para
             A produção de Brecheret possui defensores e críti-  enaltecer a figura do bandeirante de uma maneira que
             cos. O coordenador da Comissão Guarani Yvyrupá,   a gente não pode mais fazer hoje em dia”, afirma.
             Marcos Tupã, comenta o significado da obra para as   O artista Guto Lacaz, por sua vez, é fã declarado da
             comunidades indígenas. “Para nós, esse monumento   obra, que já inspirou um livro seu chamado O Roubo do
             representa uma ofensa, assim como as rodovias que   Monumento às Bandeiras. Na ficção, a escultura decide
             têm nome de bandeirantes, como a Anhanguera e a   dar um passeio pelo mundo para conhecer os patrimô-
             Raposo Tavares”, ressalta.                        nios da humanidade. “O livro é uma brincadeira. Queria
             Em 2013, o grupo organizado por Tupã realizou um   discutir como os monumentos são pouco valorizados,
             protesto contra a Proposta de Emenda à Constituição   tanto que, no final, a obra volta e não tem mais onde ficar,


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