Page 39 - ARTE!Brasileiros #38
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implícitas nas próprias obras. “Hoje, a resistên -
cia está muito mais no ativismo do que nos tra-
balhos em si. Quando o artista fala ‘Fora Temer’,
ele não está produzindo um objeto estético,
é um movimento. Há poucas produções que
tratam disso.”
Chaia acredita que essa transformação não é
boa nem ruim, sendo reflexo de uma nova con-
juntura. “Hoje há uma urgência em se expressar,
as coisas acontecem muito rápido, não é como
no caso de Guernica, de Picasso, que era uma
resposta a uma guerra longa.” Ele também cita
as redes sociais como importante ferramenta de
mobilização, permitindo que as pessoas tomem
posições rapidamente. “Mesmo com a ascensão
de políticos como Trump, não há censura e ainda
há espaço para as pessoas se manifestarem.
Antes, a crítica (de artistas) a um contexto polí-
AO LADO, CARTAZ QUE INTEGRA A SÉRIE WE THE PEOPLE,DE SHEPARD FAIREY.
ACIMA, FRAME DO VÍDEO CHIT CHAT (2007), DO ARTISTA IRANIANO TALA MADANI tico tinha que ser feita na própria obra, não havia
outra forma.”
Outro fator apontado pelo pesquisador é a emer-
gência de diversos coletivos de artistas: “Não
é mais o tempo de uma vanguarda que aponta
No entanto, há uma dimensão mais profunda que para uma única direção, são vários grupos que
Rolnik chama de potência política da arte. “Na socie- se manifestam”. Rolnik também comenta essa
dade ocidental capitalista e colonizada, nós perdemos nova conjuntura: “Desde os anos 1990, o ativismo
o contato com os conhecimentos tradicionais e com foi se distanciando da militância tradicional e
a potência criadora da natureza. Por conta disso, a incorporando novas formas. Isso se dá em vários
única atividade humana na qual é possível manter setores, inclusive na arte. Hoje o ativismo e a arte
essa germinação é a arte.” Para a psicanalista, a estão interligados. Já não é mais como nos anos
resistência está, portanto, no próprio ato de criação. 60, quando de um lado ficava a prática cultural
Rolnik ressalta que, ainda assim, com a consolida- e, do outro, a militância”.
ção do neoliberalismo, na década de 1980, o capital Chaia ainda pontua que é cada vez mais difícil
começa a se apropriar até mesmo da arte. “Hoje definir o que é a arte ou a política. “São con-
o capital tem uma inserção muito mais sutil e per ceitos polissêmicos, não é possível fazer uma
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versa do que anteriormente. Porque ele se alimenta definição fechada. E o interessante é que, hoje,
da própria força de criação e nesse sentido a arte assim como a arte se aproxima da política, tam -
levou uma porrada. Quando a comunidade artística bém acontece o inverso. Doria, por exemplo, está
se deu conta, começou uma grande movimentação fazendo performances ao se vestir de gari. E,
que permanece até hoje.” mais ainda, quando ele lança o programa Cidade
Chaia concorda que no momento prevalece um Linda, há toda uma concepção de estética, do
tipo de produção que se aproxima do ativismo. belo, que tem um sentido muito perigoso e auto-
“A relação entre a arte e a política depende do ritário”, afirma.
momento histórico. Com a ascensão de Trump e O tema da arte como resistência será debatido
mesmo a de Temer, presenciamos uma politização na próxima edição do TALKS, ciclo de debates
da arte. Hoje, o artista ganha força como ativista organizado pela ARTE!Brasileiros em parceria com
e cidadão que atua no espaço público.” a SP-Arte. O evento será nos dias 6 e 7 de abril no
Para o pesquisador, a diferença é que, em períodos auditório do prédio da Bienal de São Paulo. Acom-
anteriores, as críticas sociais e políticas estavam panhe em breve mais informações no site da revista.
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Book_ARTE_38_POR.indb 39 3/3/17 9:48 PM