Page 48 - ARTE!Brasileiros #38
P. 48

EXPOSIÇÃO SÃO PAULO






             A PAULISTA EM DISPUTA





             EXPOSIÇÃO EM CARTAZ NO MASP APRESENTA OLHARES DE DIFERENTES ARTISTAS SOBRE
             A HISTÓRIA E AS LUTAS EM TORNO DA PRINCIPAL AVENIDA DA CIDADE DE SÃO PAULO


             POR MARIANA TESSITORE



             NOS ÚLTIMOS DOIS ANOS, o Masp olhou para o seu    “É um núcleo bem diverso que vai desde fotografias
             passado. Exposições icônicas como Playgrounds e Mão do   históricas até obras do grupo Santa Helena e uma tela
             Povo Brasileiro foram montadas novamente; e o legado de   de Ferreira Gullar, que pintou o Lula discursando no vão
             Pietro Maria Bardi e sua mulher, Lina Bo Bardi, retomado.  livre do Masp, em 1979”, comenta o curador.
             Os famosos cavaletes de vidro desenhados por Lina, por  O tom politizado permanece na segunda parte composta
             exemplo, foram novamente colocados em ação.       pelas obras comissionadas. A gaúcha Rochelle Costi, por
             Neste ano, porém, o museu decidiu mirar no seu entorno.   exemplo, apresenta um trabalho feito em parceria com
             O tema da primeira exposição de 2017 é a Paulista, com   Renato Firmino, artista de rua que mora no vão livre do
             todas as contradições e embates que a avenida – endereço   Masp. Costi conheceu Firmino enquanto caminhava pela
             do museu – carrega.                               Paulista no ano passado e logo se encantou pelo homem
             “Essa mostra traz uma ruptura. Queremos agora criar   que morava dentro de um carrinho, onde expunha suas
             coisas novas que não estejam necessariamente lastreadas   telas e objetos pessoais.
             nos projetos da Lina e na própria trajetória do Masp”,   Em entrevista à ARTE!Brasileiros, Costi conta que demorou
             comenta Tomás Toledo, um dos seis curadores da mos-  oito meses até convencer Firmino a participar da mos-
             tra. Composta por cerca de 150 obras de 57 artistas, a   tra. Nesse processo, ela também filmou outros artistas
             exposição apresenta olhares distintos sobre a avenida.  presentes na avenida. O vídeo está exposto na mostra
             Os trabalhos estão divididos em dois núcleos. O primeiro  dentro do carrinho de Firmino, junto com as pinturas que
             deles exibe produções já existentes, entre aquarelas,   ele realiza sobre pedaços de madeira coletados na rua.
             performances e fotografias históricas. Já o outro eixo   A artista ressalta que a presença da arte popular dentro
             é composto por obras de 17 artistas contemporâneos,   do museu não é um dado novo. “O próprio Pietro Bardi
             feitas especialmente para a exposição. Mesmo menor   trazia obras de desconhecidos para o Masp. Não é uma
             que o primeiro, é este núcleo que dá o tom da mostra.  ação original, mas foi o que me pareceu mais genuíno
             Toledo explica que o objetivo da exposição é abordar   para essa exposição. Queria dar visibilidade para aqueles
             as ambivalências da avenida: “Ao mesmo tempo que a   que são ignorados pela sociedade”, afirma Costi.
             Paulista remete ao ideal de progresso, essa mitologia   Outra obra produzida coletivamente é a série de desenhos
             do bandeirante, ela também carrega signos de pobreza   e pinturas dos índios Ibã Huni Kuin, Bane Huni Kuin e Mana
             e violência. É nesse conflito, e não no símbolo de cartão-  Huni Kuin, da comunidade Aldeia Jordão, no Acre. Os três
             -postal, que estamos interessados”, afirma.        criaram representações da avenida que se destacam pelas
             A primeira parte da exposição adota ordem cronológica,   cores vibrantes e principalmente a quantidade de carros
             iniciando-se com uma aquarela de Jules Martin, feita em  em desequilíbrio com o número de pedestres.
             1891, tida como a primeira representação iconográfica   Para Toledo, o interessante da série é que ela apresenta
             da cidade. Seguem registros dos antigos palacetes da   uma perspectiva pouco usual da cidade: “Os desenhos
             Paulista, imagens da verticalização da avenida, fotos   invertem a lógica dos pintores viajantes que vieram da
             de protestos. Outro destaque é o registro das ações do   Europa e retrataram as terras nativas a partir da chave
             coletivo 3nós3, que atuou nos anos 1970 e 80 fazendo   do exótico. Inversamente, os índios apresentam um olhar
             intervenções no espaço público.                   sobre um lugar que também lhes causa estranhamento”.


            48




         Book_ARTE_38_POR.indb   48                                                                              3/3/17   9:48 PM
   43   44   45   46   47   48   49   50   51   52   53