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ESPOSIÇÃO SÃO PAULO



            locais, como as Bordadeiras Ocupa (o grupo Borda &
            Ocupa mstc), formado por 13 pessoas, especialmente
            mulheres da ocupação.
              “A exposição propõe a revisão das marcas e racha-
            duras políticas existentes em nossa narrativa histórica,
            ao mesmo tempo que reflete a necessidade de criar
            outras formas de pensar, relacionar-se e praticar arte
            no mundo”, disse a artista Preta Ferreira, artista e ati-
            vista que ficou mais de 100 dias presa por sua atuação
            no Movimento Sem Teto do Centro e na Frente de
            Luta por Moradia da cidade de São Paulo. A definição
            de Preta Ferreira circunscreve as motivações que
            propiciaram a aglutinação de artistas presentes na
            ReFundação: a preocupação social, a militância pelos
            direitos fundamentais do ser humano, o comprome-
            timento e a proximidade com os movimentos sociais
            e as temáticas afirmativas.
               O artista Guilherme Bretas, por exemplo, foi buscar
            no passado pioneiro o material para seu acionamento
            estético entre memória, política, tecnologia e Histó-
            ria. Ele montou, em um monitor antigo, uma anima-
            ção que se utiliza de fotos do século xix de pessoas
            negras encontradas no acervo do pioneiro fotógrafo
            Militão Augusto de Azevedo (1837-1905). Com o uso de
            Inteligência Artificial, Bretas criou uma animação das
            fotografias anônimas, exibidas em preto & branco com
            uma nova “vida”, segundo explicou. “Ao mergulhar no
            acervo do Militão, eu encontrei fotografias de pessoas
            negras de todo tipo, como por exemplo engenheiros,
            arquitetos. Isso foi algo que mexeu comigo, com a visão
            que nos passaram. A gente sempre tem essa ideia de
            que os negros estavam limitados ao trabalho escravo
            no período”, disse.
               André Komatsu faz duplo papel na ReFundação:
            integra um comitê de organização curatorial e expõe
            ali, ao mesmo tempo, seus trabalhos. Na galeria grande,
            Komatsu expõe Crónica, um trabalho da série Contrato
            Social que ele iniciou em 2018, origami de folha de chum-
            bo com a qual ele cobre parte do corpo de um exemplar
            de um determinado veículo de imprensa (deixando de
            fora apenas o nome da empresa jornalística). O objeto
            forma uma espécie de escudo. “Pensando no material,
            tanto no jornal quanto no chumbo, vejo essa dupla
            função, tanto de proteção quando de envenenamento”,
            ponderou o artista. “O chumbo, ele é tóxico; o jornal, a
            tinta utilizada, também é tóxica. E vendo essa relação
            de veiculação de informação como uma das bases
            fundadoras e construtoras da realidade, (constato)   No alto, trabalho “Lusco-Fusco”
            que é uma informação que é coordenada, manipulada   de André Komatsu; abaixo, obra
            e direcionada de acordo com interesses privados. Por   “Ossilda” de Lia Chaia

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