Page 90 - ARTE!Brasileiros #38
P. 90
LIVRO HENRIQUE OLIVEIRA
A PELE QUE HABITAMOS
LIVRO DOCUMENTA A TRAJETÓRIA DE HENRIQUE OLIVEIRA E SEU PROCESSO DE CRIAÇÃO COM
TAPUMES E OUTROS MATERIAIS USADOS PELA ENGENHARIA CIVIL; ARTISTA ESTABELECEU RELAÇÃO
VISUAL ENTRE A MALHA URBANA E OS DIVERSOS TECIDOS DE ORIGEM ANIMAL E VEGETAL
POR GUSTAVO FIORATTI
PARECE-SE MAIS COM UM CHISTE. A fotografia o universo de Oliveira, a imagem da sala branca
que abre o livro Henrique Oliveira, extenso pano- nos avisa: devemos prestar atenção no que está
rama da obra que este artista iniciou na virada por trás das superfícies. O livro configura, nas
do século, não tem traço do material cujo uso primeiras páginas, a evolução cronológica do
ele notabilizou: o tapume. A primeira imagem do que Oliveira criou, não como uma sequência mar -
livro registra uma concepção espacial estéril e de cada apenas pelo tempo, mas como camadas de
linhas retas, um corredor branco muito próximo tecidos sobrepostos. Por trás da fachada limpa,
do que seria uma sala de hospital, iluminado por encontraremos a complexidade estrutural dos
luz ainda mais branca. Não está ali a expressão compensados de madeira e variações.
orgânica que, algumas páginas adiante, revelará Publicado por uma parceria entre Sesi-SP Edi-
de fato o universo cheio de curvas, cores e formas tora, Cosac Naify e Galeria Millan, o livro, com
estranhas de Oliveira. sua introdução de ordem cronológica, explicita
A imagem foi, sim, extraída de uma de suas obras, que a obra de Oliveira partiu de um sentido bidi-
Transarquitetônica (2014), que ele concebeu para mensional para, aos poucos, ganhar volume. A
o prédio ocupado pelo Museu de Arte Contempo- ocupação espacial que deriva de suas criações,
rânea, em São Paulo. Era uma imensa instalação porém, mantém relação com a pintura mais do que
de túneis feitos com tapumes, só que havia a com a escultura, como fica evidenciado tanto no
antessala desse ambiente asséptico, um contra- texto de Agnaldo Farias como na entrevista que
ponto em relação ao que Oliveira havia criado até Oliveira concede a Aracy Amaral. Em paralelo com
então. O visitante passava por ela e, conforme o trabalho realizado com os tapumes (e depois
andava rumo ao interior da obra, o trajeto se também com outros materiais), o artista se dedicou
transmutava gradualmente, do minimalismo ao à pintura, tendo a acrílica como técnica preferida.
barroco. Revelavam-se, primeiramente, o rejunte Os suportes escolhidos por Oliveira raramente
entre os tijolos, depois o reboco; e, no final, os independem do contexto em que estão, tem ori-
túneis ganhavam a característica de artérias e gem na ideia de site specific, mantendo relações
raízes. Ao mesmo tempo que faz antítese com abertas também com o entorno para ressignificar
90
Book_ARTE_38_POR.indb 90 3/3/17 9:51 PM