Page 68 - ARTE!Brasileiros #37
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EXPOSIÇÃO SÃO PAULO


















             exposição onde estes dois universos estão coexistindo   ensinar a viver no futuro porque elas já passaram pelo
             no mesmo espaço e criando aproximações, distancia-  fim do mundo”, diz Dos Anjos, remetendo a conceitos
             mentos, atritos, acolhimentos e tensões, sempre dando   discutidos por “antropólogos como Eduardo Viveiros
             ênfase à questão da resistência”, explica Dos Anjos.  de Castro. “Quer dizer, o mundo deles já caiu. Então
             Com trabalhos – entre fotografias, pinturas, vídeos e   eles aprenderam a viver após uma hecatombe, digamos
             desenhos – de Ailton Krenak, Anna Bella Geiger, Bené   assim, que sofreram quando foram colonizados. Estão
             Fonteles, Carlos Vergara, Claudia Andujar, Delson Uchôa,   vivendo o ‘pós-fim do mundo’, e criaram formas de se
             Fred Jordão, Lygia Pape, Nunca, Paulo Nazareth e Thiago   adaptar a essa situação e de se inscrever nesse mundo
             Martins de Melo, além de adornos e artefatos de 23   pós-apocalíptico. Então temos muito a aprender com os
             populações indígenas brasileiras – dos Guarani do Sul aos  índios, em como vivem, preservam…”.
             Yanomami do Norte, dos Canela do Nordeste aos Bororo   Sobre a crescente atenção dada pela arte contemporânea
             do Centro-Oeste –, a mostra é dividida em três eixos: o   às temáticas indígenas – algo notável em exposições,
             corpo como suporte de resistência; os testemunhos de   bienais e trabalhos de artistas –, Dos Anjos acredita
             resistência; as celebrações como resistência. Segundo o   que o fato se relaciona à urgência de tratar a questão
             curador, ao colocar lado a lado produções nativas e de   em tempos de ataque constante aos direitos dessas
             artistas contemporâneos, a exposição ajuda também a   populações no Brasil. “Não é à toa que a exposição
             quebrar ideias naturalizadas e pensamentos estanques.   tem esse caráter de resistência”, afirma. Para tratar do
             “O conceito de arte, assim como o de estética, é estranho  tema, além de todos os adornos e trabalhos artísticos
             à produção indígena, e nesse sentido temos que ter muito   expostos, três vídeos na mostra apresentam de forma
             cuidado quando tratamos dela. Desse modo, colocar a   mais didática tanto aspectos relevantes da cultura indí-
             arte contemporânea e os adornos juntos pode nos ajudar   gena quanto notícias sobre a situação, por exemplo, dos
             a perceber que esses conceitos não são naturais, são   Guarani Kaiowá, um dos povos mais atacados no País.
             construídos. Nos ajuda a questionar por que uma coisa   “Na verdade, a escolha do caminho de desenvolvimento
             é considerada arte e outra não, por exemplo. Ou mesmo  econômico que foi feita no Brasil conflita, no limite,
             pensar se é possível estabelecer outras formas ou con-  com a própria existência dos territórios indígenas e,
             ceitos em que essas coisas estejam juntas: como é que   portanto, com a existência dos povos indígenas. A sua
             podemos entender uma obra fotográfica e uma pintura   existência conflita com esse desenvolvimento fundado no
             corporal no mesmo patamar conceitual?”, diz Dos Anjos.   agronegócio, na mineração e na produção agropecuária
             “Por outro lado, é preciso todo o cuidado para não tratar   para exportação que, no limite, vai passar por cima dos
             como se fosse tudo a mesma coisa, como se pudesse   territórios e direitos indígenas”, diz o curador.
             ser tudo reduzido ao conceito de arte ou de artefato.”  Dos Anjos afirma também que, apesar de a discussão
             Para o curador, a fala de Ailton Krenak apresentada no   estar crescendo no meio da arte contemporânea, ela
             vídeo tem um lugar especial na mostra justamente por   ainda é tímida diante da gravidade da situação. “Você
             ser mais que um discurso político. “É muito interessante   conta nos dedos, no universo dos artistas reconhecidos,
             como aquela fala é feita, porque está justamente no   aqueles que tratam dessa questão. Ainda estamos longe
             limite entre a pintura indígena como resistência e a   de ter esse assunto colocado com o destaque que deve-
             performance artística.” É, também, um dos trabalhos que  ria.” Exposições como A Queda do Céu (Paço das Artes,
             explicitam o quanto é preciso ouvir e aprender com os   2015), Variações do Corpo Selvagem: Eduardo Viveiros de
             povos indígenas “As populações ameríndias podem nos   Castro (Sesc Ipiranga, 2015), Histórias Mestiças (Instituto


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